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São Paulo — “O Brasil agora cresce de verdade”, diz uma propaganda do Ministério da Economia em evidência nesta semana, que se refere ao aumento do Produto Interno Bruto (PIB) privado de 2019. Segundo cálculos da Secretaria de Política Econômica, a contribuição do setor privado para a retomada do crescimento foi de 1,81% do PIB de 2019 ante 1,43% registrado no ano anterior. Enquanto isso, a do setor público recuou 1,11% ante um avanço de 0,89% na comparação anual.
O anúncio, que recebeu críticas de economistas, sobretudo pela metodologia usada na conta, começou a se espalhar na quarta-feira (04), mesmo dia em que foi revelado o desempenho da economia em 2019, quando o Brasil passou pelo seu terceiro ano seguido de crescimento tímido, com avanço de 1,1% ante a expectativa de 2,5% no começo de janeiro de 2019.
Para fazer esse cálculo, o Ministério da Economia subtrai o que é público na formação bruta de capital fixo (FBCF), ligada à taxa de investimento na economia, e soma o consumo das famílias.
Além da desaceleração do ritmo no quarto trimestre, o PIB do ano passado sofreu com a queda relevante na FBCF. O indicador mostra um recuo, visto como preocupante pelo mercado, de 3,3% nos últimos três meses do ano ante o terceiro trimestre de 0,4% na comparação anual.
Já o consumo das famílias cresceu 2,1% no ano e 0,5% no trimestre ante o período imediatamente anterior. “Como o investimento teve uma queda acentuada no período, foi o consumo das famílias que impulsionou o PIB privado”, diz João Costa Filho, professor de economia da FGV. “Esse movimento tem sido observado há anos. Quando o país depende do consumo das famílias, cresce pouco, já que não dá para esperar que as pessoas gastem 5% a mais todos os anos”, diz.
PIB Privado? PIB Público?
Vem comigo e segue o fio ??
1/— João Ricardo Costa Filho (@costafilhojoao) March 5, 2020
Apesar de as famílias terem consumido menos do que o esperado no fim do ano passado, muito influenciadas pelo pico de inflação no período, é esse segmento que deve continuar impulsionando a economia em 2020.
Movimento natural
A inversão do poder de investimento do setor público pelo privado não é nova. Em 2017, por exemplo, a diferença entre as duas taxas chegou a 3,81 pontos percentuais, bem maior do que a atual e do que a média de 0,66, registrada desde 1997.
Além disso, é esperado que o recuo do investimento público em relação ao privado se mostre mais relevante agora que o governo sofre com um orçamento engessado. “O movimento transmite o cenário pelo qual o país passa, de ajuste de gasto público ao longo dos últimos anos. É natural que o setor privado cresça um pouco mais mesmo”, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “Não é por conta desse fator (do avanço no PIB privado), sozinho, que teremos um dinamismo maior na economia a ponto de fazer o país crescer mais lá na frente”, diz.
O economista ressalta que, apesar da baixa capacidade de investimento por parte do governo federal atualmente, não podemos desconsiderar o papel do setor público como moderador e criador de políticas públicas. “Se os gastos do governo continuarem retraindo, teremos problemas lá na frente com ou sem aumento de participação do privado”, diz.
Mundialmente, a prática de divulgar separadamente resultados de investimento público e privado é incomum, já que PIB é uma soma de todas as riquezas produzidas dentro do país. Não existe um produto que seja estritamente público.
Apesar de os economistas reconhecerem a importância de haver uma eventual separação para entender como evolui a economia, Filho, da FGV, destaca que a metodologia usada pelo governo brasileiro está equivocada.
“Vamos supor que o governo comprou uma cadeira para uma escola pública. Quem produziu essa cadeira foi o setor privado, mas quem gastou com ela foi o governo. A minha dúvida é: isso é uma produção do setor privado porque vai gerar renda para o empresário, salário para seus funcionários, aluguel da empresa etc ou entra como ótica do PIB público? Há duplicidade de informações aí. Essa divisão entre público e privado parece estranha”, diz.
O fato não significa, no entanto, que o avanço do gasto privado não deve ser comemorado. “Se o governo tivesse dinheiro como tinha no passado e pudesse gastar e aumentar o déficit fiscal como no passado, provavelmente o país teria crescido 3%. É de fato o investimento privado que esta segurando”, diz, Michel Viriato, professor de finanças do Insper.
Há a avaliação ainda de que a estratégia da secretaria faz parte de um “lance de marketing”, como explica Gabriel Brasil, analista de riscos políticos para Brasil, Argentina e Uruguai da Control Risks. “Com o resultado abaixo do esperado, o governo tenta encontrar ângulos positivos para divulgar o PIB, em uma tentativa de valorizar o investimento privado no país”, diz.
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