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O avanço da pandemia do novo coronavírus pelo mundo colocou em risco não apenas as companhias aéreas, mas também diversas agências de turismo e até redes de hotéis. Desde o início da crise, o setor tem sido um dos mais impactados com o cancelamento de viagens e queda na procura.
Segundo dados da Abav Nacional (Associação Brasileira de Agências de Viagens), neste mês já houve uma taxa de cancelamentos de viagens de 85%. Além de lidar com pedidos de reembolso, a receita tem sido próxima a zero nos últimos dias em alguns casos.
O economista Luis Alberto de Paiva, presidente da Corporate Consulting, especializada em reestruturação financeira e de gestão de empresas, avalia que nos próximos meses deve haver uma onda de pedidos de recuperação judicial.
“Se a empresa não tem como fazer os pagamentos dela, está sujeita a pedidos de falência e penhora de ativos. A recuperação judicial acaba tendo um efeito imediato de fazer proteção dos ativos e evitar que essa empresa se convole em um processo falimentar”, afirmou.
Estimativa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) aponta que somente na primeira quinzena de março, o volume de receitas do setor de turismo brasileiro caiu 16,7% em relação ao mesmo período do ano passado. Isso representa uma perda equivalente a R$ 2,2 bilhões, segundo a CNC.
O cenário pode piorar ainda mais nos próximos dias. O secretário de Turismo de São Paulo, Vinicius Lummertz, prevê um cenário dramático para abril e maio, com o cancelamento de todos os voos internacionais no Brasil e queda de 80% nos voos domésticos.
Onda de falência e recuperação judicial
A associação das agências de viagem vê o cenário como a maior crise vivenciada pelo setor na era atual. “Prevemos um altíssimo índice de falências entre as empresas relacionadas ao turismo, resultando em milhares de pessoas desempregadas e impactos diretos e indiretos no PIB brasileiro”, afirmou a associação.
Segundo a CNC, os prejuízos já sofridos pelo setor têm potencial de reduzir até 115,6 mil empregos formais. A Abav afirma que o setor emprega cerca de 3 milhões de trabalhadores no país.
“As empresas não têm caixa para se manter diante de um quadro tão tenebroso. O terceiro setor recruta muita mão de obra, diferentemente da indústria e da agricultura, que já estão altamente mecanizados e com inteligência artificial. Vamos ser profundamente atingidos, pois as empresas não têm sequer horizonte do tempo que vai levar a crise e da necessidade de recuperação”, afirmou José Roberto Tadros, presidente da CNC.
Quedas de 80% na Bolsa
Grandes empresas do setor têm sofrido perdas significativas. Desde o início do ano, as ações da CVC na bolsa de valores de São Paulo já caíram 81,2%. A queda é similar à das companhias aéreas Gol (-80,2%) e Azul (-76,3%).
Apesar da queda significativa das ações, o economista Luis Alberto de Paiva avaliou que a situação é ainda mais complicada para as agências de turismo de pequeno porte. “A CVC tem a participação de fundos que teriam a capacidade de fazer aporte financeiro. Já as pequenas não têm essa condição e ainda enfrentam dificuldades para conseguir empréstimo”, afirmou.
Para o economista, deve haver uma mudança significativa no cenário após a crise. “Deve haver um processo de aquisição das pequenas agências para a consolidação do mercado”, avaliou.
Hotéis fecham as portas
O cancelamento das viagens afeta diretamente o setor hoteleiro. O hotel Bourbon Convention Ibirapuera, um dos maiores da cidade de São Paulo com mais de mil apartamentos, ficará fechado a partir da próxima segunda-feira (23). A medida vale, inicialmente, até o dia 3 de maio.
Em Santa Catarina, um decreto do governador Carlos Moisés (PSL) proibiu a entrada de novos hóspedes no setor hoteleiro de todo o estado. A medida entrou em vigor na última quarta-feira (18) e tem validade inicial de sete dias.
Campanha contra cancelamento
Para evitar um impacto generalizado nas finanças das empresas do setor de turismo, a Abav aderiu à campanha para que os consumidores apenas adiem seus planos de viagem em vez de cancelar a passagem. Isso evitaria que as empresas tivessem de arcar com custos de reembolso em um momento em que enfrentam uma queda drástica no faturamento.
“O consumidor que adia sua programação para o futuro garante sua segurança e ainda colabora com este setor, que tem grande peso na economia nacional e mundial, englobando atividades como restaurantes, hospedagens e similares, transportes de passageiros, agências de viagens, cultura e lazer”, disse a associação.
Segundo a WTTC (World’s Travel and Tourism Council), o setor é responsável por empregar 319 milhões de pessoas ao redor do mundo. Em 2018, sua contribuição ao PIB foi de aproximadamente 10,4%, com uma soma de US$ 8,8 trilhões. No país, a estimativa dessa contribuição para o PIB foi de 8,1%.
Reivindicação do setor
O governo anunciou nesta semana medidas para auxiliar as companhias aéreas e os aeroportos. A prorrogação do prazo de reembolso em até 12 meses auxilia também as agências e hotéis, já que é um incentivo para o passageiro remarcar o bilhete em vez de cancelar a viagem.
A Abav espera, no entanto, que outras medidas sejam anunciadas pelo ministério do turismo nos próximos dias. As principais reivindicações são:
- Disponibilização de linha de crédito especial na Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil para as empresas de turismo, com carência para início do pagamento de no mínimo seis meses.
- Aprovação de decreto para postergar o pagamento de impostos relativos à folha de pagamento, também por seis meses, desde que quitados no exercício de 2020.
- Liberação do saque do FGTS para funcionários de empresas que exerçam atividade turística.
- Parecer favorável do ministério da Justiça em relação à remarcação de viagens contratadas pelo consumidor, frente ao cancelamento e devolução de valores. A Abav alega que as agências não possuem reservas hoje para realizar a devolução de valores e a remarcação da viagem seria uma solução para manutenção do negócio sem prejudicar o consumidor.
- Redução do IRRF a 0% nas remessas para pagamentos de serviços turísticos ao exterior.
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